Jornal Pires Rural – Edição 194 | CAMPINAS, FEVEREIRO de 2017 | Ano XII
Denis Maracci Gimenez professor do Instituto de Economia da Unicamp expôs em sua palestra que a “Previdência Social não pode ser avaliada de maneira isolada, porque ela foi montada sobre bases diversas de financiamento para prever riscos diversos”, durante o Seminário sobre a Reforma da Previdência Social, realizado pela Associação Paulista de Extensão Rural (Apaer).
A proposta de reforma da Previdência Social no Brasil está sendo tramada com a pecha dela ser a grande vilã das contas públicas do país. A questão é levantada o tempo todo nos meios de comunicação ou pela boca de alguns políticos de Brasília, que dizem haver um desequilíbrio estrutural por causa dos pagamentos efetuados aos beneficiários da Previdência Social. A posição daqueles que estudam o assunto da Previdência Social, como por exemplo, os académicos do Instituto de Economia da Unicamp, tem uma visão real de que a Previdência não é culpada pelo desequilíbrio das contas públicas do país. Foi esse parecer apresentado durante o Seminário sobre a Reforma da Previdência Social, realizado pela Associação Paulista de Extensão Rural (Apaer), no o auditório do Centro de Treinamento (Cetate) da CATI, em Campinas, no final de janeiro.
O objetivo do seminário, foi discutir a reforma da previdência, as regras atuais e as propostas, com o objetivo de sanar as dúvidas dos trabalhadores, levantar propostas e encaminhar moções e reivindicações com vistas a colaborar e atender às principais demandas e expectativas relativas ao funcionalismo público estadual, assalariados em regime CLT e setor agropecuário.
Constituição Federal de 1988
“O centro do debate, é que toda justificativa para a reforma da Previdência, atualmente, é corrigir desequilíbrios que sacrificam todo o setor público brasileiro, todo investimento do Estado na sociedade brasileira. Digo que essa afirmação é falsa porque a Previdência Social no Brasil, foi organizada e integrada ao Sistema de Seguridade Social, implementado na Constituição Federal de 1988. Ou seja, não é apenas um sistema de previdenciário é um sistema de Seguridade Social. A esse sistema foi montado um orçamento pra Seguridade Social”, pontuou Denis Gimenez. Temos 3 grandes orçamentos no Brasil; o orçamento fiscal, o orçamento da Seguridade Social e o orçamento das Estatais, juntos compõem o orçamento Geral da União. “Portanto, há um orçamento próprio da Seguridade Social que conta com receitas e despesas. Do lado das receitas da Seguridade Social temos receitas previdenciárias, receitas do Ministério da Saúde, recursos vindo das Loterias Federais, todas as contribuições sociais como Cofins e a antiga CPMF. Do lado das despesas da Seguridade temos despesas do Ministério da Saúde, do INSS, despesas com assistência social. Os deputados constituintes de 1988 organizaram um sistema onde a Previdência Social não pode ser avaliada de maneira isolada, porque ela foi montada sobre bases diversas de financiamento para prever riscos diversos”, observou Gimenez. Sendo assim a Previdência Social é um gasto previsto e que é executado com a arrecadação.
Agricultores e trabalhadores do setor agropecuário
A aposentadoria rural, foi discutida e inserida dentro da Seguridade Social, pela Constituição de 1988, por questões históricas e características do país, reconheceu-se que os trabalhadores rurais teriam direito a Previdência, contariam com amparo e financiamento do orçamento da Seguridade Social, e não especificamente de um fundo de previdência que desse base para a aposentadoria rural. “Para enfrentar situações distintas, de proteção social, previdenciária e assistência social, criou-se uma base de arrecadação também diversificada. Por isso que tecnicamente não faz nenhum sentido falar de um déficit da Previdência, porque eu não posso isolar a Previdência do orçamentos da Seguridade Social. É uma despesa, e é errado chamar de Déficit”, exemplificou Gimenez.
Fazendo as contas
Segundo relato do professor, se somarmos o orçamento da Seguridade, incluindo a Previdência, adicionando as receitas desse orçamento, no ano de 2015 com recessão e queda na arrecadação, tivemos um superavit de R$ 20 bilhões no orçamento da Seguridade Social, “sobrou dinheiro”. No ano de 2014 o superavit foi de R$67 bilhões e desde o governo Fernando Henrique esse orçamento teve superávites permanentes. “Se eu raciocínio pensando no orçamento Geral da União e como ele deve ser olhado estruturalmente, eu tenho que compreender, não posso identificar que a Previdência seja o grande vilão das finanças públicas no Brasil. Quero chamar a atenção de vocês para esse ponto, é importante separar os argumentos para evitar precipitações em relações as necessidades de reformas e a profundidade dessas reformas”.
Juro Alto e Recessão
“Cada novo governo que toma o poder tem retirado recursos do orçamento da Seguridade Social e passado para o orçamento Fiscal, fundamentalmente para fazer frente a elevada carga financeira da gestão pública. Foi divulgado recentemente o déficit fiscal de 2016, onde 85% foi produzido pela elevada carga de juros. Certamente se quisermos eleger o grande vilão das contas públicas no Brasil é a carga de juros. Se gasta 50% do orçamento para pagar o custo da dívida pública. Evidentemente, quando se faz uma política monetária e coloca a taxa de juros onde está, o principal efeito disso é violentamente desorganizar as contas públicas. Não é o ‘velhinho da Previdência’ que está deixando rombo no país, mas é o juro alto e recessão”, definiu Gimenez.
Desde 2014, a desorganização das contas públicas vem dando o ar da graça, e no momento atual, a população tenta identificar que são os problemas da corrupção. Gimenez relata que o fato do componente estrutural da degradação financeira do Estado, das finanças pública do Brasil hoje, é a recessão pela queda da arrecadação. “Não há uma explosão de gastos pelas famílias nos últimos anos. O que houve em 2015 e principalmente em 2016 foi uma elevada queda de receita, puxado pela recessão. Haja visto que Estados governados pelos mais diversos partidos políticos estão em uma situação dificílima, e o que não era uma crise fiscal, devido a desaceleração da economia, se transformou em uma crise fiscal. Destacar esse fato se faz importante para retirar a centralidade do sistema previdenciário dizendo que ele penaliza o Brasil” frisou Gimenez.
As pendências internacionais
Há uma tendência mundial, bastante acentuada nos países europeus, de uma alta participação de recursos do orçamento fiscal para o financiamento do sistema previdenciário, ou seja, as contribuições do governo, empresários e trabalhadores não estão sendo suficientes para sustentar a proteção previdenciária. Isso acontece devido as mudanças demográficas. Segundo relato, o Brasil vive uma “janela” demográfica, isto é, não tem tantas crianças e ainda não tem tantos idosos, portanto o estado “janela” demográfica que estamos vivendo é ótimo, o meio da estrutura demográfica é cheio. Mudanças dessa natureza impõe desafios à cobertura previdenciária e aumento de recursos fiscais para o financiamento do sistema, na medida que grande parte da vida dos cidadãos europeus fica fora do mercado de trabalho. “A questão no Brasil, que virou uma espécie de violência contra as finanças públicas, foi dizer que o governo tem que gastar mais com o sistema previdenciário porque a arrecadação não paga as contas, primeiro ponto: não dá porque estão tirando recurso da Seguridade social e passando para o orçamento fiscal, e segundo ponto: não é nenhuma aberração usar recursos fiscais sustentando os sistemas previdenciários, isso inclusive é uma tendência internacional” relatou Gimenez sobre outro argumento usado para a imediata reforma da Previdência.
A reforma
O debate atual sobre a reforma do sistema previdenciário brasileiro, vem com uma retórica de que nada foi feito desde a Constituição de 1988. Montou-se a Previdência Social tal como está na carta Magma e não houve nenhuma mudança. Gimenez reforça, “isso também não condiz com a realidade. Se verificarmos no governo de Fernando Henrique Cardoso encaminhou uma reforma que estabeleceu idade mínima de aposentadoria. Emenda constitucional número 20, estabelecendo 60 anos para as mulheres e 65 anos para os homens, antes disso, valia o tempo de contribuição, atingindo, 30 anos para as mulheres e 35 anos para os homens, aposentava. O presidente Lula quando assumiu em 2003, fez uma nova rodada de reformas na Previdência, mudando a integralidade da aposentadoria do setor público. A presidente Dilma Rousseff, em 2015, encaminhou uma reforma que estabeleceu a regra 85/95, que é uma regra que tenta contabilizar tempo de contribuição e idade contribuinte. Essas reformas foram no sentido de segurar os gastos com a Previdência, então, não é verdade que os gastos da Previdência explodiu, porque não foi feita nenhuma reforma. Isso resume que já temos regras duras de aposentadoria no Brasil, regras que visam reduzir as possibilidades de aposentadoria precoce, reduzir as diferenciações entre os setores público e privado”, destacou Gimenez.
Crescimento econômico
Para concluir Gimenez foi enfático dizendo, “não é possível fazer uma Previdência adequada às necessidades de proteção dos idosos do país, sem que a economia cresça, isso arrebenta com o mercado de trabalho e corroe a base de arrecadação da Previdência. Então,
a primeira coisa para se discutir Previdência seriamente é começar por uma política de recuperação do crescimento. É difícil de acreditar, que tem alguém investindo se vivemos uma taxa de juros de 13% ao ano, um mercado interno encolhendo e capacidade ociosa em quase todos os setores da indústria. Discutir seriamente Previdência é discutir crescimento econômico e formalização do mercado de trabalho, carteira de trabalho assinada e empresas recolhendo impostos. Ninguém faz no mundo uma Previdência boa com a economia andando de lado”, finalizou professor Denis Gimenez.