*Felipe Campos, estudante do ensino médio técnico, ativista antirracista
Falar de consciência negra em um país que contém 54% da população formado por pessoas pretas – o segundo maior país do mundo com negros – e ter que falar o porquê esse tema é necessário é algo preocupante, senão desesperador. Afinal, se nós somos maioria, por que ainda precisamos provar diariamente que pessoas brancas precisam ter consciência da injustiça social que vem acontecendo conosco há mais de 400 anos?
Nos últimos anos, principalmente na data de 20 de novembro, o termo “antirracismo” vem crescendo e sendo mais estudado, principalmente no ano de 2020 com a morte de George Floyd, um homem negro que morreu asfixiado por um policial cujo ato fora gravado nos Estados Unidos, que gerou a popularização do movimento Black Lives Matter ou Vidas Pretas Importam.
A frase da filósofa brasileira Djamila Ribeiro explodiu na internet nesse contexto de revoltas com a morte de George: “Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista”. Mas afinal, como a população branca pode ser antirracista e por que deveriam abster-se de seus privilégios e forçar a construção social de um Estado mais igual?
Vamos começar falando sobre o racismo. Afinal, o que é o racismo e quem o comete? Existe uma discussão gigante, principalmente entre internautas quando se fala de racismo, pois na cabeça da maioria das pessoas o termo remete majoritariamente a ofensas feitas a um outro indivíduo baseando-se na cor de sua pele. Entretanto para entendermos melhor, precisamos encaixar o racismo dentro de uma pirâmide, uma pirâmide hierárquica – de níveis. A população branca está em cima dessa pirâmide e as populações colonizadas (indígenas e pretos) jogadas como inferiores. O racismo não se baseia exclusivamente na pessoa branca quando ela comete algo explícito a pessoa que está na base. Mas, o simples fato de ela sair de casa, sem sair com o RG, enquanto um menino negro precisa se preocupar desde os 10 anos a nunca estar sem o seu documento para ter algo para apresentar para a polícia, caso for parado, já comprova a existência do sistema racista. Não é necessário que existam atos individuais, porque a sociedade como um todo está fazendo com que a população negra se encaixe no sistema racista e, pior ainda, ignora esse fato, portanto, a pirâmide continua intacta.
“Dos polícia eles conhecem o distintivo, ‘nóis’ a bota. Tem algum dermatologista aí pra me explicar por que que a pele negra é a pele morta?” – essa é a frase que o rapper Djonga começa sua parte na música “Obstinado”. Genocídio da população negra, falta de representatividade, menores salários, maiores taxas de cárcere, menor taxa de alfabetização, maior taxa de suicídio entre crianças. É perceptível, deixando óbvio dessa maneira, como o racismo é responsável por todas essas situações e como você, pessoa branca, se não estiver diretamente lutando está sendo responsável por isso?
E lutar contra o racismo não é postar hashtag (#) em redes sociais não. Porque muitas pessoas pretas estão longe do Twitter e Facebook e encarando o sistema racista sem poder usar sua voz. É necessário revisar o básico primeiramente e ser sincero consigo mesmo. De qual forma você enxerga pessoas pretas? Quantas pessoas pretas você ainda se acha na intimidade de poder fazer brincadeiras com suas feições? Por que você acha que é isento de ser racista enquanto inúmeros outros falam o mesmo que você e continuam tendo papel na morte de mais de 80 jovens negros brasileiros diariamente? Se questione até de onde vem o estereótipo vexatório e ridículo de corpos pretos na pornografia e tantas outras falácias e injustiças acometidas por pessoas brancas.
Ser antirracista te obriga a te tirar da bolha, é incômodo para quem foi criado dentro de uma cultura que normalizou o racismo estrutural e te força a admitir que você já foi ou é racista e talvez para você não mude nada, mas 54% da população brasileira continuará tendo consequências pelo seu pensamento, pois, se o homem branco está no topo, são os seus pensamentos que “valem mais” dentro da nossa sociedade racista e patriarcal.
É preciso acompanhar as mudanças sociais, pois independente de você querer ou não, elas estão acontecendo. O pensamento citado acima da prepotência do homem branco está gradativamente sendo desconstruída e quem não muda, fica para trás. E ficar para trás é sinônimo de ser esquecido e seu ódio será algo retrógrado em uma sociedade futura utópica que combate as discriminações sociais.
Saia da bolha, mude seus pensamentos, ensinem os seus filhos a serem diferentes e entender a revolução vigente. Pois, foram 400 anos que a população negra lutou bravamente e se preciso, serão mais 400 anos que lutaremos até que o racismo seja extinguido. E quem não estiver conosco, estará contra nós. E contra nós, não estará dentro da sociedade que nós estamos lutando para construir pouco a pouco. “Não tem dor que perdurará, nem teu ódio pertubará. A missão é recuperar, cooperar, empoderar. Já foram muitos anos na retranca, mas preto não chora, mano levanta […] foco e atenção na nossa ascensão” – Emicida, Papillon e Jé Santiago, Eminência Parda, 2019. É com essa frase que termino esse texto, para que saibam que ser antirracista é crucial para todos, primeiramente, porque precisamos lutar por uma sociedade mais igual e, segundo, porque nós estamos ascendendo e lutaremos contra quem for necessário.