Fim do vazio sanitário, foi dada a largada para o início de um novo ano safra – 2021/2022-, o produtor tem um cenário totalmente modificado pela alta do preço das commodities, alta do dólar e consequentemente alta nos custos de produção, além da forte influência das mudanças climáticas impactando no resultado da colheita. Diante disso, fomos ouvir a opinião de alguns produtores sobre qual é o maior desafio desta safra.
Temerosos na escassez do volume de chuvas e, a estratosférica alta dos defensivos, herbicidas, agrotóxicos, sementes e adubos, eles compartilharam a situação a enfrentar na nova safra, inclusive acendendo o sinal de atenção quanto ao futuro da produção alimentar, agravando a fome no Brasil diante da pressão do cenário agrícola aos pequenos produtores, vários não vão plantar esse ano, outros já pensam em abandonar a atividade.
Sofrendo com falta de chuva
Cássio Russi é de uma família tradicional da citricultura em Limeira, porém, desde 2008 estão se dedicando ao plantio anual de grãos como a soja e o sorgo, no bairro Santa Helena. Para o jovem produtor um dos maiores desafios “está sendo os preços muito elevados de insumos e defensivos. Mesmo ( adquirindo) parte desses produtos comprados antes da época, seus preços estavam altos devido a grande procura, isso acabou elevando os preços”, disse.
Questionado sobre o retorno do investimento que tem nas safras e, se manteve ou foi ficando mais apertado, diante dos custos de produção, Cássio disse que não houve declínio, inclusive, “devido aos preços do ano passado estarem muito bons, tivemos um retorno bom, que ajudou a melhorar os maquinários”.
Um desafio preocupante para ele é questão das chuvas, “vejo também que as chuvas, esse ano está meio escassa. Estávamos sofrendo com falta de chuva, desde o início do plantio nos primeiros dias de novembro. Chegamos a perder um pouco de soja, que teve que ser replantada”, revelou.
Fechar o ciclo
Tiago Marson investe na produção de laranja e milho, no bairro rural Palmeira, em Limeira, pela sua experiência na agricultura ele destaca; “tivemos um desafio grande na safra de milho passada, devido a estiagem bem severa e hoje, além da estiagem, o que nós temos pela frente é uma luta intensa contra pragas e a alta dos insumos. É pedir a Deus para que tudo ocorra bem, para que venha chuva no final de dezembro e no mês de janeiro, pois, tenho uma área plantada para colheita mais tarde, em fevereiro. Torço que chova bem para fechar o ciclo, o enchimento de grãos. Tenho que citar também o agravante, somando a alta dos preços dos adubos e defensivos, a alta do diesel e do petróleo”, apontou Tiago.
Temos que dar até um passo pra trás
Para Alessandro Wolf, que está na cidade de Altinópolis (SP), e segue a mesma trilha da citricultura que seu pai Adilson Wolf, há 50 anos nesta atividade, os desafios também se baseiam nos custos de produção, preço da mercadoria, qualidade das frutas, pragas e mudanças climáticas, de acordo com ele, “os insumos muito altos e o preço baixo pago pelos nossos produtos, aliada a seca muito severa, caiu muito a qualidade das mercadorias vindo do campo. Consumidores reclamam demais, eles falam que os produtos estão ruim com preço caro. O clima influenciou muito na qualidade e produtividade das laranjas. Um pé de laranja aqui em Altinópolis produzia em torno de 10 a 12 caixas, reduziu para 3 a 4 caixas. Algumas variedades de laranja caiu ainda mais, chegando de 1 a 2 caixas. Vejo isso acontecendo na maioria das regiões produtoras”, descreveu.
Alessandro diz que a seca foi o maior fator dessa queda na qualidade dos frutos e apenas quem tem acesso a tecnologia, “conseguiu amenizar um pouco, através de um sistema de irrigação por gotejamento ou aspersão. Em algumas regiões, mesmo o produtor que tinha a irrigação, ficou sem água pra irrigar,” acrescentou.
O HuangLongBing (HLB – Greening), doença dos citros constatada pela primeira vez em 2004, na região central do estado de São Paulo, está disseminada em larga escala pelos pomares, na região onde está Alessandro não é diferente, ele afirma, “o Greening não só afetou como está acabando com o parque citrícola do estado de São Paulo e parte de Minas Gerais. Hoje, a maior desmotivação do produtor é o Greening”, frisou.
Alessandro ainda vê entraves como a falta de “mão de obra qualificada para o setor. Isso está muito ruim também”, disse. Por essas dificuldades cada vez mais acentuadas Alessandro comenta que “já pensamos muito em mudar de ramo, migrar para soja pois, a tecnologia dos grãos proporciona uma pessoa cuidar de muitos hectares. Por exemplo, quatro funcionários cuidam em torno de 1000 a 1500 hectares de soja ou milho. Enquanto na laranja, para cuidar de 200 hectares, precisarei de dez a quinze pessoas, só pra fazer os tratos culturais, fora colheita que varia entre uns quinze funcionários temporários”, descreveu.
A produção de citros da família Wolf está direcionada ao Ceasa, devido a alta da demanda, eles ainda compram frutas de outros produtores, “porque só nossa produção não dá conta de suprir nosso consumo. A falta (de laranjas) só não ocorreu por causa da pandemia. Que limitou muitos comerciantes de trabalhar e, as escolas que consumiam muitos produtos do campo”, revela.
A princípio, devido a pandemia do coronavírus, manter a alta demanda pelos produtos hortifrutigranjeiros pôde parecer que não houve queda nas receitas para os produtores mas, não foi isso que Alessandro informou. “Sim, a pandemia afetou as vendas. Muitos clientes que compravam laranja nossa, por eles não trabalharem, deixaram de comprar. Aí, virou uma corrente e repercute no produtor”, afirmou.
Alessandro analisa a situação e suas atitudes será de cautela diante do quadro econômico atual, levando em consideração os preços dos insumos, a questão do clima, a baixa produtividade; “muito pé no chão nas decisões a serem tomadas. Um passo de cada vez. Em algumas situações temos que dar até um passo pra trás, como agora, pra não ver o que você conquistou em muitos anos ir por água abaixo”, destacou.
Lá na frente, vai fazer falta o produtor pequeno
Conversamos ainda com o produtor Silvio Delgado do bairro dos Frades. Em sua opinião o maior desafio desta safra é o clima, “não chove, estou pressentindo que a maior dificuldade será a falta da chuva. Eu até estava com um pedaço de terra separada, adubo e sementes de milho compradas mas, não vou plantar não. Resolvi passar para uma pessoa. Estava analisando o caso e, não convém eu plantar. Estou com metade das terras arrendadas para cana-de-açúcar, uma parte tem laranja e outra parte era do milho que cancelei. Essa gangorra do tempo, chove ou não chove fez eu desistir de mexer com plantio esse ano. O custo hoje é muito alto, pelas minhas contas um alqueire de milho fica R$12 mil. É plantar e arriscar pra ver se dá alguma coisa, isso é complicado”, lamentou Silvio, afirmando que isso já aconteceu outras vezes, “produtor vive de risco, pode ser que tome prejuízo num ano e no outro também e assim vai. Hoje, o óleo diesel está R$5,20 o litro, quem consegue tocar o trator?”, questiona.
Indagado pelo motivo o qual arrendou suas terras para o plantio de cana-de-açúcar, ele citou que “há quatro anos atrás o preço da laranja estava péssimo, o preço do milho estava ruim e o da soja mais ainda. A cana era a melhor opção na época”.
Perguntamos como ele entende essa questão atual do cenário agrícola, “eu acho que a questão econômica mudou pra pior a situação do agricultor. Veja bem, subiu o preço do milho? Subiu. Subiu o preço da soja? Subiu. Mas o preço do herbicida triplicou, eu paguei um galão de 20 litros de glifosato, há oito meses atrás, R$300,00, hoje, o mesmo galão está R$1.100,00. Como eu falei do óleo diesel hoje é R$5,20, custava o ano passado R$3,60 o litro. Acho que piorou o cenário agrícola”, respondeu.
Para finalizar, indagamos se ele acredita que tudo isso que está acontecendo veio pra tirar muitos agricultores da atividade, sua resposta foi incisiva e acende um sinal amarelo quanto ao futuro da produção alimentar, agravando a fome e colocando em risco a diversidade de alimentos no Brasil; “Acredito que muito produtor vai sair da atividade. O produtor pequeno não está conseguindo sobreviver mais da agricultura. O grande foi sufocando o pequeno e esse não sobrevive mais, infelizmente está assim. Eu sou produtor pequeno, a maioria na nossa região é produtor pequeno. Um exemplo, você não vê mais aqueles formadores de mudas em pequenos canteiros, que tirava um dinheirinho pra sustento, esse ficou proibido. Outro, tinha uma criação pequena de porcos para abate e venda no final do ano, também não pode ter mais. Ficou inviável ser produtor pequeno, esse não tem vez, infelizmente. Mas pode ter certeza que isso vai refletir lá na frente, pode ver que vai fazer falta o produtor pequeno. Ele vai fazer falta pela seguinte questão; querendo ou não, o pequeno produz leite, queijo, isso não é produção de grande escala, são os pequenos que contribuem para chegar num volume grande. Outro exemplo é milho pipoca, é o pequeno que produz, porque se existir uma plantação de milho convencional perto não produz pipoca, fica tudo milho. Agora não estão sentindo a falta do pequeno, ainda, mas lá na frente, quando começar a faltar comida esse pequeno vai fazer muita falta. Principalmente em nossa região metropolitana. Pode ver que as cidades estão emendando umas nas outras, com isso, tem muita gente para comer e poucos para produzirem e aqui quem produzia era o pequeno agricultor e vai acabar, pode ter certeza. Você come soja todo dia? Você come milho todo dia? Nem eu! Então, por essa questão vai faltar comida. Já reparei que na região de Andradas (MG), que tem aqueles pequenos criadores de gado de leite, vi que a cada ano estão abandonando a produção. Ou colocou o gado de corte no lugar do gado de leite, porque o preço pago não convém manter a vaca, levantar de madrugada, tirar o leite, não tem sábado, domingo, nem feriado, chega uma hora a pessoa cansa, porque não compensa mais”, Silvio concluiu.