Jornal Pires Rural – Edição 218 | CORDEIRÓPOLIS, Julho de 2018 | Ano XII
Almejando as boas perspectivas do cenário citrícola no curto e médio prazos, o Centro de Citricultura Sylvio Moreira, comemorando seus 90 anos, trouxe novamente Dra. Margarete Boteon, para apresentar as recentes análises de mercado da citricultura paulista pelo Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada) da Esalq/USP, no quarto dia da edição 40ª da Semana da Citricultura, da 44ª Expocitros e do 49º Dia do Citricultor, em Cordeirópolis – SP.
Anunciada como integrante do “hall da fama da citricultura brasileira”, Dra. Margarete enfatizou que sua explanação tem foco no mercado, entretanto, ela chama a atenção na “importância de reconhecer instituições. Tanto as instituições que promovem o consumo de laranja quanto as instituições que favorecem um ambiente de negócios melhor. Para que elas não percam sua importância e possam se fortalecer, em longo prazo, para a competitividade citrícola. Temos boas notícias em termos de mercado para o citricultor mas, sem instituições fortes para produtores de pequena e média escala, que lutem para eliminar a imagem negativa do suco de laranja, não adianta estoque baixo do suco de laranja (na indústria) ou a Flórida diminuindo a produção. São essas instituições que serão um reagente para um desafio futuro. O ambiente de negócios tem que ser favorável para continuarmos crescendo”, ressaltou.
A nova safra (2018/2019) Margarete chamou de “dinâmica” e “tem muita coisa por vir” e ainda, “temos que enfrentar o inverno, que tudo indica que vai ser seco. Talvez projetem uma safra menor mas, enfim, a análise de mercado parte de uma leitura contínua. O Cepea tem-se dedicado, eu gostaria de agradecer todo o grupo da equipe de citros que formou esse conteúdo, que estarei apresentando”, disse.
De modo geral, a apresentação abordou oferta/demanda para o cenário 2017/2018/2019 e principalmente o fator de como o greening (HLB) aliado a uma descapitalização do setor no período 2012/2015, interveio no manejo dos pomares e sua viabilidade. Ela ressalta, “temos um cenário econômico bom para esse e próximo ano, uma perspectiva favorável em médio prazo, em se tratando de oferta. Embora, tenha que ser feito o cálculo da renda gerada na citricultura que é transferido para o produtor”, salientou.
Calculo risco
Margarete foi criteriosa ao dizer, “nem todas as propriedades são viáveis economicamente”, mesmo o preço sendo 22, 25 ou 26 por caixa. É importante ao produtor calcular o risco do setor, como também entender que na citricultura há uma nova recomendação tecnológica para o manejo dos pomares que tem um preço elevado. “O gasto médio, anualmente, está em R$15 mil, isso é quase o dobro que se tinha há 10 anos. Para retornar esse investimento é primordial uma produção elevada. Saiba que produção elevada não é desejo e nem uma fábrica que sai automaticamente alta produtividade, vai depender de diversos fatores e alguns não são controláveis, por isso é bom saber se temos recursos financeiros para aguentar as diversidades. O negócio da citricultura mudou muito, um dos fatores é a atividade industrial e a outra é a questão do greening. O Projeto citrícola é um projeto de 18 anos, sendo que em 8 anos, o pomar tem que reverter todos os investimentos que foram feitos. Isso não é olhar a produtividade, é olhar o quanto vai se gastar e depois ver se isso se paga. No Brasil 18 anos é muito tempo, sendo que não temos certeza se haverá fretes na próxima semana? É uma questão mais ilógica! Então, é importante pensar numa citricultura de longo prazo, nas instituições de longo prazo, o que o produtor tem de recursos dentro da propriedade para essa nova demanda tecnológica ou não. É um investimento que tem se valer muito pra ter um retorno rápido”, destacou.
Parque da laranja
Margarete também citou a crise citrícola 2012/2015, segundo ela, essa crise teve características como queda abrupta de preços frente aos custos, dificuldades de escoamento da produção e redução da área cultivada da citricultura, afetando principalmente as propriedades de pequena escala, abaixo de 10 mil plantas (80%). “Ainda podemos ter uma redução maior de área (plantada), um pouco menor frente ao período da crise citrícola. Se pensarmos há 15 anos atrás, estaríamos falando em torno de 800 mil hectares e hoje o parque citrícola São Paulo e Triangulo Mineiro somam 400 mil hectares de laranja. No passado tínhamos 27 mil propriedades e hoje, o Fundecitrus relata 5.800 propriedades com laranja. Embora tivemos um ganho tecnológico, que representa produzir mais nesses 400 mil hectares, porém, com um custo bem elevado e, se tirarmos um retrato da área de cultivo estimada, não temos um estoque de plantas novas para manter o parque citrícola com a produção atual, mesmo se colocarmos uma produtividade maior por árvore o nível do parque citrícola, hoje, não se mantém produtivo com a taxa de renovação de plantas atual”, ela frisou.
Greening
Margarete mostrou dados que evidenciam a crise de preços baixos combinado com a dificuldade de manejo dos pomares, intensificando o percentual de greening nas pequenas propriedades, até 10 mil plantas, chegando a 30% do total, inviabilizando o pomar, tornando essas, as propriedades que mais abandonam o setor. “Sem a tecnologia para combater o greening, inviabiliza as pequenas e médias propriedades de laranja. Estamos num ambiente favorável, atualmente, sem tantas variedades de preços mas, se o patamar sair de R$25,00, dependendo do contrato, e cair para R$15, mais uma parte da citricultura se inviabiliza. É importante entender que precisamos de ações de médio e longo prazo, como estabilidade negocial. Porque o clima, não temos como interferir. Dólar? Sabe-se lá o que vai ser! Pelo alto valor do pacote tecnológico, se o preço (da caixa de laranja) voltar a dez reais, quebra-se em um ano e, pomar não aceita desaforo. Ou o produtor tem um portfólio diversificado com outras culturas ou diversificado com outras qualidades de laranja, que lhe dê segurança e consiga manter o fluxo de caixa — devido o investimento que a citricultura exige para manter o nível baixo de greening — não é possível mais uma oscilação de preços tão grande como a que ocorreu no passado recente”, completou Margarete.
Que leitura podemos fazer do mercado com a previsão de safra 282 milhões de caixas?
“Estamos entrando numa safra com estoques elevados mas, com uma necessidade de suco de laranja maior do que nos últimos anos. A Flórida tem reduzido sua produção, a última estimativa é 45 milhões de caixas. Nos últimos 8 anos, batemos o recorde de exportação para os Estados Unidos, tanto em volume quanto em receita, esse ano, exportamos 60% a mais do que 2017. O que isso representa? Isso significa que temos que ter, na média, uma safra com 350 milhões de caixas para manter esse patamar. Não sei até quando isso vai se manter mas, pelo volume de exportação, essa deveria ser nossa produção citrícola. É um ano bom de preço mas de baixa produtividade, eu enxergo que o ano de 2019 será muito melhor que esse, porque tem aumento de produtividade e patamar de preços bons. As estimativas que faço no consumo de 1 milhão de litros para exportação, ao menos que as indústrias reduzam muito as exportações, os estoques podem chegar a níveis muito baixos. O interessante é que no curto prazo passaremos dois anos com preços positivos e sem sinais de excessos de estoques. Isso dá um fôlego ao citricultor pra investir ou pagar as dívidas”, ela relatou.
Investimentos
“Citricultura não é cultura anual, é importante saber quanto o pomar vai produzir em 18 anos, para pagar o investimento mas, a questão mudança climática tem impactado o setor, sendo uma variável de difícil controle. Impactam diretamente na produtividade, dependendo do nível de tecnologia aplicada no manejo, maior tem que ser a produtividade para pagar os custos. Tem pacote (de manejo tecnológico) que eleva o potencial produtivo da laranja para 1.600 caixas por hectare mas, tem um preço pra isso e ainda, corre o risco de não ter essa produtividade. Outro coisa é o greening, pensando em 18 anos, por mais que se faça o manejo a dispersão de HLB, pode correr o risco de não extrair o investimento que teve. Qual é a lógica? Extrair maior produtividade em menor tempo possível, se o pomar durar 20 anos, perfeito! Teve 2 anos de lucro. Mas, o ideal é viabilizar esse pomar para 15 anos de produtividade. A estimativa do Cepea, só para tratamento do greening, são necessárias 30 pulverizações por ano ao custo de R$6 mil, independente do preço da caixa, o citricultor terá o custo dessa tecnologia. Para isso, ou se organiza num fluxo de caixa suficiente para conseguir em momentos de aperto financeiro manter esse nível tecnológico ou praticamente todo o projeto de 18 anos se inviabiliza. Para cada caso existe uma sugestão de pacote tecnológico. É preciso pensar que no negócio citrícola, o citricultor não pode perder patrimônio. O cenário de mercado é bom sim, tem uma perspectiva de médio prazo boa, mas, a conta da fazenda tem que ser feita, não dá mais para assumir risco sem um cálculo apurado, já tem risco demais que é impossível calcular”, enfatizou Margarete.
Projetos em revista
A pesquisadora do Cepea disse que a instituição elaborou uma análise econômica de dois Projetos que, em essência, levam em consideração o manejo intenso dos pomares de laranja, para ter baixa incidência de HLB (greening), aumento da produtividade e tornar mais eficiente a gestão da fazenda, agenda que faz parte da atual fórmula de sobrevivência na citricultura. “De alguma forma, essas análises deram um resultado positivo, a análise de rentabilidade dos modelos de alta tecnologia, deu um lucro liquido de 10 a 15%, isso para um projeto de 18 anos é muito bom, isso dá mais que (investir em) banco, (investir) em terra, e dá mais que cana (de açúcar). Já que o investimento e risco na citricultura é alto, 15% cobre ? Essa é a questão. Se compararmos esses cálculos com os últimos 10 anos, os 15% não vão dar, teria que ser 30%. É modelo viável a alta tecnologia, é com produtividade que irá viabilizar a citricultura mas, hoje o custo total, se o pomar for irrigado, chega a R$23 mil por hectare, o fluxo de caixa da propriedade de 200 mil plantas deve ser de R$ 10 milhões por ano. Os pacotes tecnológicos apresentados nesses dois Projetos, não permitem adaptação dos gastos, tem que ter fluxo de caixa para aguentar situações boas ou ruins, aí o Projeto se viabiliza em 18 anos. Mais detalhe desses estudos no site do Cepea (http://www.hfbrasil.org.br/br/revista.aspx)”, concluiu Margarete.