Jornal Pires Rural – Edição 204 | CAMPINAS, Outubro de 2017 | Ano XII
O Seminário Mudanças Climáticas, Gestão de Riscos e Seguro Rural na Agricultura Brasileira, aconteceu no Instituto de Economia da Unicamp, em setembro. O objetivo foi apresentar um cenário das ameaças representadas pelas mudanças climáticas para a economia como um todo e para a agricultura brasileira. Eduardo Assad, pesquisador da Embrapa Informática Agropecuária, participou com o tema: “Mudanças climáticas e riscos econômicos para a agricultura”.
Nos últimos cinquenta anos houve o aquecimento do planeta, a degradação da terra, a perda de biodiversidade, o aumento de CO₂, dióxido de carbono e metano – os três gases diretamente ligados a atividades agropecuárias. Ainda temos altos índices de poluição e uma situação crítica no abastecimento de água. A terra tem limite e nós achamos que não. “O assunto hoje é segurança alimentar e os estudos estão indo na direção do aquecimento global, segurança alimentar, segurança hídrica e segurança energética, pois, corremos um risco muito grande em não combinar esses atores. Os estudos já apontam a possibilidade de mais chuvas na região Sul, redução no Centro-Oeste, chuvas bem intensas no Nordeste e na Amazônia haverá redução de chuvas — se houver essa redução a situação é preocupante”, afirmou o pesquisador Assad. Segundo Eduardo Assad ainda temos que considerar na somatória do cenário mundial, “a taxa de crescimento populacional. Hoje, é de dois a três partes /milhão/ano — a cada 10 anos. Vamos chegar a 30 milhões em 2027”, salientou.
De acordo com Assad, há alguns bilhões de anos atrás, a temperatura da terra chegou a subir 2º, depois caiu e agora está subindo novamente. Se compararmos essa variação de temperatura com a do nosso corpo, onde mantemos uma temperatura de 36.5º e a nossa temperatura corporal aumentar 1º, “passaremos a 37.5º, o que é considerado estado febril. Se aumentar mais 1º será 38.5º, teremos uma temperatura no corpo considerado doente. É a analogia que temos feito hoje, temos que evitar esse aumento de temperatura porque daí pra frente o risco aumenta demais em todos os ambientes, a ideia é parar o crescimento de CO₂ na atmosfera para preservar o homem”, exemplificou o pesquisador.
O Brasil centrou seus esforços no Acordo da COP 21, na mitigação — reduzir suas emissões de gases. A agricultura emite milhões de toneladas de CO₂ equivalente, é o principal emissor de metano, que é a fermentação de fezes do boi e do cultivo do arroz (considerado pequeno, mas, se dá importância porque é o metano, 25% mais forte que o CO₂), seguido dos resíduos do solo por fertilizantes sintéticos. “O modelo de agricultura que adotamos é totalmente dependente dos fertilizantes. Conseguimos suprir a dependência de nitrogênio apenas da soja, o milho é dependente da soja. A cana-de-açúcar está caminhando para retirar o nitrogênio desses fertilizantes. Por outro lado, usamos muito calcário (que emite muito CO₂). É possível mudar esse modelo de agricultura? Existem vários resultados em escala industrial mostrando que sim. Espero que lancemos mitigadores de nitrogênio para gramíneas, aí chegamos no pasto — estamos falando de 120/140 milhões de hectares — esse é o problema que hoje procuramos resolver”, destacou Assad. Em sua visão, o esforço mundial para a redução de emissões, mais as medições que estão sendo feitas, nos colocam em cima da pior curva. “O cenário não é nada favorável porque estamos numa situação de emissão muito forte, em cima do pior cenário. Até o aumento de 2º na temperatura, a gente consegue discutir o que pode acontecer. Acima de 2º, não fazemos ideia do que pode acontecer”, ele avaliou.
Estudo para inglês ver
O pesquisador citou que a Inglaterra solicitou um estudo aos pesquisadores da Embrapa para investigarem os limites da temperatura. Foi constatado nos estudos uma grande probabilidade de ocorrer o aumento da temperatura em 4º até 2050. “As probabilidades de aumento nos próximos anos é muito alta. Qual é o impacto disso na agricultura? Se você pega de Macapá até a Cidade de Franca (SP), chegamos a curvas de medições que terão frequência de dias com temperaturas superior a 34º, é muito alta. O que significa isso? Significa que os pintos de um dia de vida vão morrer, o gado de corte chega a perder duas arrobas por período e lavouras perdidas. Façam as contas dessa consequência. O café e a citricultura vão perder florada e produtividade. O prejuízo é imenso. E nenhuma seguradora vai querer garantir a safra. Quando se joga as previsões para o extremo — o estudo que fizemos para os ingleses, esses são os limites — se não fizermos adaptações nessas culturas, todas elas não serão mais produzidas nas regiões tradicionais. Antes, a região que assustava as seguradoras era a região Sul mas, com o passar dos anos, será a região que vai de Macapá até Franca — porque vai esquentar, deixar de ter geada, passará a ter cana-de-açúcar, mandioca e banana com o clima mais quente”, constatou o pesquisador Assad.
Em resposta a pergunta dos pesquisadores brasileiros para os ingleses, sobre a intenção dos resultados dos estudos, a resposta foi de que o objetivo é fazer o planejamento para a cidade de Londres para o ano de 2300. “A preocupação dos ingleses se refere aos diques do rio Tâmisa, o qual suporta até o nível de 4m e, se a temperatura e o nível do mar continuar subindo e atingir 7m a cidade de Londres desaparecerá. E ainda, querem saber se esse fenômeno acontecerá em outros países. É um planejamento de longo prazo e é o que temos que fazer com a nossa agricultura também. Os impactos diante da previsão do aumento de temperatura, é de que em 2085 o milho safrinha desapareça, porque mantidas as características das cultivares de milho que temos hoje, na grande maioria são cultivares de verão — não suportaria. Não estão adaptadas para a queda brusca de água. Já a cana-de-açúcar e a mandioca vão se dar bem com o aquecimento da temperatura. Vão sofrer consequências drásticas a soja, o milho (de outono) e a pastagem”, afirmou o pesquisador.
O cenário em termos de perdas, quando é que a gente perde e chega a sete bilhões de reais/ano, essa primeira estimativa foi feita em 2010, foi publicado no livro do Banco Mundial “Economia das Mudanças Climáticas”, são sete bilhões de reais em perdas. “Acontece que nós já chegamos. Já estamos muito perto dessa perda de sete bilhões de reais. Em 2009, foi feito um relatório para o então Ministro que queria saber o número das perdas, os estudos envolveram instituições como IAPAR, Embrapa, Epamig, Epagri – SC — cada um fez sua análise e algumas sugestões para a mudança de zoneamento — e os documentos estimaram 5,5 milhões de reais em perdas, em 2009. O veranico de 2014 foi muito intenso, trouxe consequências, na região norte do Mato Grosso (um lugar que nunca se esperava) perdeu três plantios seguidos de soja — quando isso ocorre, é a hora que você tem que tomar uma decisão, plantar ou não plantar. Essa decisão um dia vai acontecer”, ele disse.
Para o pesquisador deverá ocorrer a mudança na base estatística do zoneamento de trinta anos para dez anos de período de previsão para pegar essas previsões do que já está acontecendo e poder trazer o mais perto possível da realidade econômica. Segundo dados apresentados, os Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo apresentam situação mais críticas em termos de preservação de área de proteção permanente. “Então, quando se pensa numa estratégia de controle de aquecimento global, veja primeiro se o local tem ou terá água. Só se fala em crescimento se tiver água. Confesso que, recentemente estive no Espírito Santo e voltei chorando, principalmente depois do desastre de Mariana – MG. E ainda, temos o uso e ocupação do solo, podemos observar bem quando visitamos Sorriso, Sinop, Lucas do Rio Verde, onde vemos as áreas de proteção permanente preservadas mas, a ocupação do solo todo desmatado. A discussão não se trata de ter um trabalho policial. É um equilíbrio entre o que temos de vegetação e para poder manter a água dos rios ou da chuva, não estamos conseguindo avançar nas discussões e a escassez dos recursos e previsão de aumento da temperatura vai afetar a economia brasileira”, concluiu o pesquisador Assad.