- Artigo de José Victor Parreira Rezende, Psicólogo – Fundador e diretor do Grupo Cuidar Limeira
As mulheres constantemente são vítimas de agressões ou abusos de natureza física e psicológica. A pior parte é que informações como essas acabam passando despercebidas por boa parte da população, levando-nos a acreditar que talvez essa parcela da nossa sociedade esteja corrompida pela doença do “não me importo”.
Oras, se a nossa geração está falhando justamente com aquela pessoa que nos trouxe ao mundo (mães também são mulheres), o que seríamos capazes de fazer com todas as outras pessoas? Cabe a nós, portanto, passar aos nossos filhos os valores reais de uma sociedade psicologicamente saudável e bem resolvida. O futuro a ser escrito é o que fará real diferença entre uma sociedade que respeitará ou que continuará maltratando as mulheres.
Atuando como psicólogo em instituições que acolhem crianças desamparadas, percebi que parte do que colhemos hoje, em forma de agressão (principalmente com o gênero feminino), tem sua origem na dificuldade que os pais tiveram em lidar com seus próprios impulsos agressivos, atrapalhando assim o ensino do respeito ao próximo e principalmente deixando de dar exemplos construtivos aos seus filhos.
Talvez possa ser mesmo difícil para a maioria dos pais conversarem sobre feminicídio com sua filha, ou instruir seu filho, a não cometer abusos com sua futura esposa. Mas colocando uma lupa sobre a situação conseguimos enxergar que podemos trabalhar com conceitos básicos, de forma simples e clara, onde consequentemente causará uma mudança enorme nos comportamentos futuros.
Partindo desse princípio, temos como pontapé inicial de toda a mudança: você, que está lendo essa coluna. Qual exemplo você dá aos seus filhos? É necessário antes de tudo entender o contexto. Eu, como pai, mãe, pratico uma comunicação não violenta? Como eu educo? Se você já deu umas palmadas e percebe que isso causa mais medo do que educa, então, está no caminho certo. Passe a praticar novos hábitos; vale assumir que você não é perfeito e está aprendendo também.
Um dos melhores métodos para se falar com meninos e meninas sobre o feminicídio, para além das palavras, são os gestos que nós mesmos fazemos, ou seja, o exemplo que nós damos.
Te convido a refletir: “A criança vítima de violência não tem consciência de que essa realidade não é anormal e que precisa ser protegida. Ela tem percepção de que a vida é assim mesmo. Já a criança que tem um lar tranquilo pode não ter a percepção de que outras crianças podem sofrer violência”.
Ao assimilarmos isso, o próximo passo vem do diálogo com os pequenos. Uma boa oportunidade de se falar de violência é quando um caso é noticiado pela TV, pela internet; é preciso dizer para ela que aquilo está errado. Na hora que acontece, é o melhor momento. Essas conversas devem ser acolhedoras e em tom de orientação, não de repreensão ou terrorismo pois, isso pode acabar tendo como consequência o despertar do medo na criança diante da possibilidade de denunciar casos de violência.
As melhores práticas da psicologia orientam aos pais que procurem sempre conversar com a criança e não usarem de castigos. As crianças sabem que há diferença entre menino e menina; ela vê brincadeiras diferentes, em sua maioria; os pais podem mostrar quem é a mulher hoje, que ela não é só criada para cuidar da casa, dos filhos. É necessário falar que não há uma disputa entre homem e mulher, mas que o ser humano tem direitos, desejos, sonhos. A forma como os pais educam ficam nas entranhas do futuro adulto.
E se a criança quiser se manifestar, colocar para fora a raiva que interna ou comunicar algo que não consegue fazer através das palavras? Use a arte! A arte em geral facilita o acesso às emoções e sentimentos. Dá, sim, para brincar com o teatro, com o cinema, com livros, com a música. Até com aquelas músicas que fazem apologia à violência; se a criança está ouvindo isso, aproveita para diferenciar o certo do errado, o bom do ruim. Apresentar essa diferença é possível desde pequenininho, claro, adaptando à percepção dele.
Quem tem filho (de sexo masculino) precisa dizer que o outro merece o amor e o respeito independente do que for. Não é porque é mulher, que é homem, animal ou qualquer outra coisa que merece menos. Se for isso o que passamos para os nossos filhos enquanto pequenos, será isso que colocarão em prática no futuro.
Vale lembrar que é muito importante ensinar aos pequenos que as causas têm suas consequências. Não podemos quebrar um banco na praça, não podemos jogar lixo no chão, não podemos agredir o amiguinho na escola e não podemos praticar nenhum tipo de violência contra as mulheres, isso é lei e tem consequência. Em nossa constituição existem mais de 40 artigos que asseguram punições contra qualquer caso de violência doméstica e na família diante de uma mulher, independente do parentesco e sexo. O agressor pode ser padrasto ou madrasta, sogro ou sogra, cunhado ou cunhada, entre outros.
E reforçando que além das agressões físicas, a violência pode ser psicológica, sexual, patrimonial, e/ou moral. Nenhuma delas é aceitável. Por outro lado, tudo isso pode ser poupado quando passamos os verdadeiros valores para nossas crianças de forma amigável, amorosa e compreensiva. Qual futuro queremos para nossos filhos e filhas?