- Talita Barros
Parar e pensar no número de professores que passou, passa e passará pela vida de alguém é um exercício que nos convida a perceber a magnitude de uma relação que acontece durante o processo de aprendizagem. Seja qual for a área de conhecimento, o professor é alguém que contribui para que as habilidades sejam despertadas, que as trocas de hipóteses se potencialize e fortaleça o movimento de existência dentro de uma família, de uma comunidade e de toda a nação.
O ano de 2020 e 2021 trouxe junto com a Covid-19 a preocupação de se manter não atingível para o vírus e de se manter atingível às pessoas que, naquele momento distanciadas construíssem uma relação diante de um mundo todo mergulhado no caos. Isso foi possível apenas pelo poder de se reconectar de modo diferente, com ferramentas para além do olhar, do toque, do sorriso.
Durante dois anos incertos, os professores foram impulsionados pela certeza de que as tentativas necessitariam se achegar a cada criança, a cada adulto, a cada aprendiz. Assim impulsionados, não pela maneira natural das coisas, mas arrastados pela avalanche de cobranças vindas diretamente ou não dos pais, instituição e de si mesmos.
O sono já não era mais o mesmo, alimentar-se de preferência com alimentos fáceis e rápidos de serem preparados, o movimento do corpo na ação de chegar-se até a escola, antes diário, foi trocado por horas imóveis em frente ao computador, planejando, criando conteúdo entre quedas de internet por motivos diversos; do lado de lá das telas esperava mais e mais do lado de cá.
Os aparelhos celulares carregados antes de vivências pessoais passou a estar carregado de vozes nem sempre acolhedoras, pois, o trabalho invadiu a casa, dormiu na cama e ainda sucumbiu alguns relacionamentos.
Não nos foi ensinado de onde tirar resiliência suficiente para lidar com as dores físicas e emocionais, não houve tempo de assimilar o contexto mundial, de pisar no chão e entender por onde começar. O fato é que em meio a pandemia só não existiria a opção parar. O trabalho foi dobrado, triplicado, entre choros e a sensação de não estar dando conta da demanda. Os planejamentos necessitaram mais ainda de mentes criativas e que além de criar, tinham a responsabilidade de imaginar como seria o processo de experiência e resolução das crianças com os seus familiares.
Infelizmente, herdou-se desses anos de pandemia o aceleramento do ritmo da vida, o registro de professores com crises de ansiedade, o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos, depressões; aumentou o que é visível para além de gráficas e com o partir em partes do Covid-19. E, o novo instrumento e acolhimento das crianças nos espaços de creche, escola não trouxe a normalidade que já se imaginou que não seria o novo normal, trouxe cargas intensas.
Agora, os professores passaram a lidar com a defasagem em diversos sentidos, pedagogicamente e socialmente. A ansiedade adquirida no isolamento pelas crianças é algo preocupante da qual tem gerado pauta para as reuniões pedagógicas: como entender a subjetividade de cada criança? Como criar novos meios de comunicação? Enfim, como acalmar um corpo que em tamanha euforia de retornar à escola sente dificuldades em esperar e percorrer pelo processo antes do resultado final?
Ao abordar algumas das questões nada facilitadoras nesse retorno no novo normal é necessário trazer o quanto de profissionais da educação, nesses dois anos, se descobriram aptos para estarem em áreas antes jamais pensadas na maioria das vezes motivados pela falta de valorização profissional pelo desgaste emocional que a profissão acarreta. Iniciou, então, no ano de 2022 algo que daria para chamar de sobrevivência profissional gerado pela falta de profissionais nas salas de aula. Os processos seletivos ganharam força, a tentativa dos municípios em modificar o número de quadro de funcionários fez em pouco tempo a homologação dos processos seletivos de professores temporários acontecer, até mesmo para garantir o que é de direito e, o que os documentos norteadores da educação traz para cada especificidade, mas até que esse movimento, que aconteceu no segundo semestre, tomasse forma muitos profissionais se viram sobrecarregados.
A grande questão que em tempos normais ou o novo normal traz é o fato de se esperar do profissional da educação o poder de ser resiliente. Os fatores externos não podem afetar cada professor(a), a sua saúde física e mental necessitam estar sob total equilíbrio, mas onde está o suporte emocional que para tanto se espera? Quem acolhe aquele que só tem feito acolher? E a valorização profissional de acordo com o que o professor deveria receber? As palavras de incentivo que poderiam ser vindas da gestão e da comunidade, onde estão?
A formação dos professores é um ponto que cada vez se faz mais presente, alguns cursos, gerado pela instituição da qual os professores estão inseridos, outros, por meio de parceria com universidades estaduais e federais, baseiam como situação de crise na educação a falta de profissionalismo dos professores e, elencam como solução uma avalanche de cursos presenciais ou virtuais sem contar ainda que a imagem sempre reforçada de que o professor necessita exercer sua profissão por amor, se naturaliza e transforma essa naturalização em cobranças externas e internas.
Entra, então, a necessidade de desmistificar, de mudar o conceito, convidar a enxergar qual é o real papel do professor na educação dos alunos, uma das maneiras é tornar acessível à comunidade, às famílias, os documentos que norteiam a docência, estabelecer interações que os convidem a enxergar que a integração acontece para além da sala dos espaços escolares.
O movimento forçado, trazido pela pandemia, onde o professor foi impossibilitado de estar diretamente com as crianças e a necessidade de que a família estivesse presente nos desenvolvimentos parciais das experiências e atividades, ao mesmo tempo que evidenciou a importância do profissional da educação no cotidiano de aprendizagem, também trouxe o amargo das críticas, como se enxergassem mas, não desejassem enxergar e, agora, nesse retorno ao espaço educacional a ideia do que se espera do professor ficou um tanto mais conturbada.
Torna-se preciso reconhecer o trabalho e esforço antes, durante e pós-Covid-19, compreender que mesmo com a evolução incrível da tecnologia, não existe computador que silencie a voz dos professores, pois, são eles quem libertam, que participam no processo de aprendizagem, que vibram com as conquistas adquiridas, que enxergam as possibilidades, que trazem elementos para que o processo seja criativo e significativo, que elogiam, que facilitam a possível escolha profissional, que auxiliam na organização de pensamentos, que impulsionam as crianças pequenas, grandes, adolescentes e jovens a contarem o que sentem, como veem o mundo, que os convidam a serem agentes de transformação do agora.
Reconhecendo o trabalho e o esforço, na maioria das vezes, os professores têm de planejar e necessitar buscar materialidades fora do espaço escolar, já que por motivos como falta de verba, falta de envio de materiais específicos são obrigados pela circunstâncias a improvisar elementos para que seja garantido conhecimento.
O aspecto prioritário relacionado ao reconhecimento do trabalho e esforços dos professores, será realmente considerado um progresso quando nesse reconhecimento incluir a valorização do docente quanto a remuneração, a inserção dos direitos trabalhistas, carga horária ajustada de acordo com sua designação.
Enquanto o coletivo de profissionais da educação luta por reconhecimento, não somente no dia de hoje, mas em cada pisar nos espaços escolares exercite a gratidão, demonstre parceria com aqueles que se especializaram para receber, que participam ativamente da vida de seus educandos.
Enquanto o coletivo de profissionais da educação luta por reconhecimento do trabalho e esforços, há de se considerar que os professores fizeram diferença nesse contexto pandêmico e no retorno à escola, é perceptível o quanto cada professor(a) desse país fez diferença nos seus contextos e realidade mais variados.
- Talita Barros – Graduada em Pedagogia pela UNASP. Atuou como professora e coordenadora na cidade de Limeira, participou na formação de professores, módulo Educação Antirracista na UNIFAL. Atualmente é professora de educação infantil na prefeitura de Piracicaba e desenvolve parcerias com pesquisadoras em Angola