As notícias que circulam devido ao conflito armado no Leste Europeu, países cuja a dependência brasileira é quase integral na compra de fertilizantes químicos para o uso na agricultura, especula-se a falta desses produtos e isso afetará pequenos, médios e grandes produtores, ou seja o agronegócio, principal balança comercial do Brasil, setor que obteve um superávit de US$ 105,1 bilhões em 2021.
Importamos da Russia anualmente, cerca de 20% do volume de fertilizantes químicos consumido no Brasil, podendo chegar a 80% incluindo Belarus, um país fiel aliado Russo. Devido a guerra declarada pela Russia contra a Ucrânia, os Estados Unidos e a União Europeia tem introduzido medidas restritivas como sanções econômicas e com relação à exportação de bens de navegação marítima e tecnologia de comunicação por rádio para a Rússia e Belarus, visando sufocar ainda mais essas duas economias, para encerrar o conflito de forma pacifica o mais rápido possível. Apesar de não cair nenhuma bomba no Brasil, os efeitos dessa guerra podem explodir por aqui.
Contatamos agricultores e técnicos em nossa região agrícola, para saber a percepção referente ao conflito Russia x Ucrânia, destacamos a conversa com o Nogueirense, João Sarpa, senhor de 67 anos, que guarda boas lembranças da lida com o pai na agricultura desde os 13 anos de idade. Sr. João é contador de formação, assim como o pai porém, ambos escolheram a agricultura para sobreviver. Além de produtor rural, há 35 anos atua como distribuidor de insumos, principalmente sementes e adubos.
Sr. João, está produzindo em uma área de 340 hectares, soja e milho. A semeadura da safra 2021/2022, em sua maior parte, foi realizada na segunda quinzena de novembro, “a expectativa nas primeiras semeaduras eram boas, agora, as últimas estão sofrendo um pouco com o enchimento do grão por falta de chuva. Já iniciamos a colheita do milho, está com uma produtividade boa, os talhões estão produzindo de quatrocentos a quinhentos sacos. Daqui mais uns dez dias vamos iniciar a colheita da soja, com uma excelente expectativa naquelas áreas semeadas primeiramente”, revelou.
Ameaça
Frente a questão das consequências do cenário da guerra Rússia x Ucrânia afetar os negócios, Sr. João Sarpa nos disse, “a questão da guerra, lógico que nós tememos toda consequência, afinal aquilo que acontece no mundo ou no país e, fique sem domínio, a agricultura é a primeira que recebe as consequências. Esse conflito afeta o agronegócio sim! Acredito até que vamos ter uma inflação muito grande, devido ao aumento de preços. Não só aumento de preços de fertilizantes e aumento de combustível mas, vai afetar todo o agronegócio. O temor também é quanto as exportações, a balança comercial do Brasil é movida pelo agronegócio. Apesar de estarem guerreando, a logística ainda está funcionando mas, se a guerra impactar a logística? Não vamos poder mandar produtos pra fora, então, ficamos apreensivos. Mas, se Deus quiser, a gente torce pra que termine logo e tudo se resolva”, observou.
Hora da compra
Perguntamos qual época costuma comprar os fertilizantes e o que leva em consideração na hora da compra? “A esse respeito costumo dizer que ‘em casa de ferreiro, o espeto é de pau’. Eu acabo sendo um dos últimos a adquirir fertilizantes. O ano passado fiz a aquisição, para meu uso, em duas etapas, uma logo em agosto e a outra foi em outubro, essa eu paguei caro. Eu não tenho uma época definida para a compra. Eu fico na especulação de comprar com o melhor preço, é claro, todos ficam. Às vezes acerto, esse ano acertei só em metade dos insumos”, descreveu.
Colheita sem adubo
Afirmando Sr. João disse, “o agricultor é o único que não para! Percebe-se tudo o que acontece contra ele e, mesmo assim não para. Leva pau numa safra mas, já tem esperança na safra seguinte”. Em um cenário da escassez de fertilizantes ele cita, “pode acontecer do agricultor plantar um pouco menos. Já vi em nossa região plantar sem adubo e, ter uma boa colheita. Acho que até um ano, dá pra passar sem adubo. Tem produtor que já está providenciando esterco orgânico para fazer a adubação. Diminuir a área de plantio? Acredito que será muito pouco, porque ninguém quer deixar área descoberta, sem plantar nada, precisando dar jeito no mato. Se fosse comigo, eu não diminuiria a área de plantio, eu adubaria menos e usaria um pouco de adubo orgânico”, apontou.
Planejamento
Baseado na experiência do mercado, perguntamos se ele percebe o produtor planejar seu negócio antecipadamente? “Eu sou da opinião de que o agricultor deve sempre planejar antecipadamente, é aquele velho ditado ‘quem chega no rio primeiro, bebe água limpa’. Falando como vendedor de insumos agrícolas, em 2021, eu cheguei a vender uma determinada fórmula de adubo a R$1600,00 a tonelada e depois no final do ano, vendi essa mesma fórmula de adubo a R$6000,00. Quem comprou no início, quem se garantiu na safra e, pensou em deixar os insumos para a próxima safra já comprados, digo que esse produtor ganhou dinheiro. Eu pessoalmente, já não sou assim, fico sempre esperando a melhor oportunidade, como já disse. Seria interessante se organizar bem cedo e já deixar todos os produtos da safra vindoura comprados para não ter correria. Outro exemplo recente, no final de 2021, foi um sufoco para conseguir adubo e quando conseguia não tinha transportadora para fazer o frete. Muitos atrasaram o plantio em consequência disso. Acho que deveríamos antecipar, todo produtor, apesar que agora, a partir desse 2021, a gente aprendeu e vai começar a antecipar as compras, inclusive eu!”, destacou.
Momento atual
Outro questionamento que fizemos, é como ele avalia o momento atual de nossa região agrícola? “A nossa região está bem diferente do que era antigamente. Nossa maior área plantada está em cana-de-açúcar. Sendo que uma época atrás existia, cana, laranja, milho. Quantos plantios de arroz eu vi por aqui! Agora, está entrando a soja mas, ainda a predominância é a cana. Acho que isso não é bom. Monopólio de cultura, nunca foi bom e nunca será bom. O bom é quando se diversifica entre aquelas culturas que possam ser existente aqui na nossa região”.
Previsão
Para finalizar, perguntamos se diante do quadro de guerra, estiagem, escassez de produtos, aumento de preços, monopólio da cana, há como prever quais as consequências para nossa região e para o produtor? Sr. João respondeu, “as consequências para o produtor, não só no Brasil mas no mundo, é a descapitalização. O agricultor entrou numa safra 2021/2022 e terminou o plantio descapitalizado. Não vejo que isso se altere na próxima safra. Vai vender o milho bem, vai vender a soja bem mas, ele vai gastar bem para repor tudo de volta, não tenha dúvida. Eu só espero, que nós tenhamos os produtos, que a nossa logística de importação não tenha embargos pois, dependemos muito de fertilizantes importados. Estamos com certa garantia de fornecimento de produtos pelos países aos quais o Brasil importa mas, na logística não temos uma garantia. Se essa guerra demorar muito pode ser que sejamos penalizados pela logística. Lembrando um fato muito importante, na agricultura não se faz cálculo por um ano de safra, tem que fazer a média de três anos. Então, esse ano, pode ser que puxe a média para baixo, mas nunca podemos considerar um ano só. Temos muitas intempéries que impacta na agricultura, como estiagem ou chuva demasiada. Por isso os cálculos são na média de três anos. Pode ser que nessa safra tenhamos que “engolir” a guerra Russia e Ucrânia e, fazer a média pra frente. Vamos ver o que surge”, concluiu.